quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Sair do euro?

Desiludam-se os que pensam que Portugal tem muito a ganhar em sair do euro

 

Como já aqui referi, a discussão de saída do euro vai voltar a estar em cima da mesa, como já esteve em 2011 e 2012, quer em função das eleições na Holanda, em França, na Alemanha e em Itália, quer também por iniciativa do PCP em Portugal. Por isso, convém falar sobre o assunto, para desfazer ilusões e equívocos.

Em primeiro lugar, é importante distinguir entre saída do euro e fim do euro. Neste último caso, haveria um acordo consensual de que não seria conveniente ou sustentável prosseguir com a moeda única e ter-se-ia que chegar a acordo sobre os termos desse fim, uma negociação difícil, porque estariam envolvidos valores muito vultuosos e também porque não existem regras sobre o assunto, porque o euro foi criado para ser irrevogável, uma falta de humildade incrível dos seus criadores. 

O caso da saída isolada de um país é muitíssimo diferente, porque seria previsivelmente feito contra a vontade de todos os outros e iria gerar uma enorme instabilidade sobre todo o sistema, ao abrir a porta a outras saídas, agravando as taxas de juro de todos os países em dificuldades e podendo mesmo criar a necessidade de novos resgates aos Estados mais frágeis. Por tudo isto, é de esperar que as condições negociadas por um país isolado sejam especialmente duras.

A questão seguinte é distinguir as consequências para os países de uma saída isolada, em função das suas condições actuais, concentrando essa análise em apenas duas variáveis (por uma questão de espaço): a taxa de câmbio e as taxas de juro de longo prazo.

A saída da Alemanha (o ideal para começar o fim do euro) iria provocar uma clara apreciação do novo marco alemão face ao euro e talvez uma ligeira subida das suas taxas de juro, que estão a nível demasiado baixo, gerando protestos de muitos alemães, tendencialmente poupadores.

A saída da Holanda, que também tem um elevado excedente externo, deveria ter consequências semelhantes às da Alemanha, podendo-se considerar que os seus efeitos serão alguma melhoria do poder de compra associada a algum abrandamento da economia pela apreciação da moeda, efeitos que tenderiam a se anular mutuamente.

No caso de França, com algum défice externo, poderia ter lugar uma depreciação modesta e uma ligeira subida das taxas de juro, o que poderia ser encarado, no global, como moderadamente positivo, com a depreciação a ajudar a reduzir o desemprego, pelo efeito de aumento da competitividade.

No caso da Grécia, estima-se que a retirada do euro conduzisse a uma depreciação brutal, da ordem dos 50%, que não poderia ser compensada por subida de salários, sob pena de se entrar numa espiral inflacionista, sempre incapaz de impedir a queda dos salários reais (descontada a inflação). Ou seja, a saída do euro seria seguida por uma forte queda do poder de compra, que poderia ser em parte compensada por uma queda acentuada do desemprego, desde que (uma hipótese heróica) o país não entrasse num período de instabilidade económica e política.

O caso português está, infelizmente, mais próximo do caso grego, estimando-se que necessitaríamos de uma depreciação real entre 20% e 30%, à qual corresponderá uma forte queda do poder de compra. No nosso caso, já seria mais razoável estimar uma redução do desemprego, porque a nossa economia, durante a intervenção da troika, teve uma depreciação real muito menor do que na Grécia, mas o crescimento das exportações foi muito superior.

A análise precedente foi muito circunscrita sobre os efeitos da saída do euro, mas há duas conclusões que ressaem. Por um lado, uma saída isolada é muito mais penalizadora do que uma saída colectiva ou fim do euro. Por outro, Portugal é dos países que poderá perder mais com uma saída isolada do euro. Convinha que os portugueses percebessem isto e não caíssem nos cantos de sereia do PCP. 


[Publicado no jornal online ECO]

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