segunda-feira, 12 de janeiro de 2015

Brincar com o fogo

Ou não há cedências a curto ao novo governo grego, e isso coloca problemas dentro em breve, ou há cedências e teremos problemas a médio prazo

Faltam menos de duas semanas para as eleições legislativas antecipadas na Grécia, que têm muitas condições de criar fortes perturbações na zona do euro, devido à liderança do Syriza nas sondagens.

Não vale a pena especular sobre a exacta composição do próximo governo grego, mas tudo indica que se assistirá a um braço-de-ferro entre este executivo e os seus parceiros europeus, com destaque para a Alemanha.

Num primeiro caso, consideremos que havia um conjunto de cedências à Grécia (incluindo um perdão parcial da dívida), que permitia que este país continuasse com acesso a financiamento e com um governo em funções. Os problemas dissipar-se-iam no curto prazo mas iriam avolumar-se a médio prazo, sobretudo nos países que mais deverão sofrer com aquele perdão, com o crescimento do sentimento anti-euro.

Num segundo caso, as exigências do novo governo não seriam atendidas (qualquer que seja a razão para isso) e a Grécia daria uma série de trambolhões até ser, na prática, forçada a sair do euro.

Este cenário está longe de ser considerado irrealista, porque fontes próximas de Merkel já disseram em entrevista ao Spiegel que a saída da Grécia do euro seria gerível, ao contrário do que se passaria há alguns anos. Julgo que estas afirmações não são apenas uma forma de pressionar o eleitorado grego, mas constituem uma descrição fidedigna do pensamento nas principais figuras da CDU, embora o SPD já se tenha demarcado delas.

O que isto sugere é que, nas negociações com o novo governo grego, a liderança alemã não estará disposta a fazer grandes cedências, já que não acredita que os gregos tenham a bomba atómica nas mãos. O que nos colocaria mais próximo do segundo caso descrito do que do primeiro.

Esperemos que os outros parceiros europeus, bem como o próprio SPD, façam suficiente pressão sobre Merkel, para que a Grécia não seja empurrada para fora do euro, ainda por cima quando tiver como primeiro-ministro Alexis Tsipras, que tudo indica ser uma pessoa que gosta de brincar com o fogo. É facílimo imaginar um conjunto de jogadas imprevisíveis e arriscadas que acabem pessimamente.

Mas o governo alemão também parece estar a brincar com o fogo, ao acreditar na ilusão de que a saída da Grécia do euro não faria estragos de maior nesta área monetária, que está muito longe de ser óptima.

Com o actual nível extremamente baixo das taxas de juro de longo prazo (pelas piores razões, porque o crescimento é débil e existem fortes riscos de deflação prolongada), o financiamento orçamental de vários países não suscita dúvidas de maior. Mas basta uma subida daquelas taxas de juro para tudo se inverter e esta subida pode ocorrer em pouco tempo, a duração de uma tragédia grega. E daí até ao novo risco de um efeito dominó é um instante.


[Publicado no DiárioEconómico]

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