sexta-feira, 24 de maio de 2013

Rever pensões

Temos quase só um trabalhador por cada pensionista, pelo que é impossível não mexer nas pensões

Quando falamos em rever as pensões a primeira coisa que temos que olhar é para o número de trabalhadores cujas contribuições sustentam os actuais pensionistas. Temos uma tendência, já com muitas décadas, de aumento do número de reformados e, na última década, de diminuição do emprego. O resultado conjugado destes dois efeitos tem sido um brutal estreitamento entre aqueles dois números.
Neste momento, já só há mais 850 mil trabalhadores do que pensionistas. Por cada reformado já só temos 1,2 trabalhadores. Com estes números, com os problemas nas contas públicas (em que a maior rubrica são as pensões) que enfrentamos e com a carga fiscal esmagadora, há uma conclusão óbvia a retirar: é impossível não mexer nas pensões.

Façamos então um breve retrato das pensões em vigor. Temos 3,6 milhões de pensionistas, dos quais 40% não são pensões “normais”, mas sim de invalidez, sobrevivência e outras. Esta percentagem parece-me excessivamente elevada, mas não vou elaborar sobre isto.

As pensões “normais” têm uma distribuição pelos diferentes escalões de rendimento com diferenças brutais entre o regime geral e o regime público (CGA). No regime geral, 78,3% estão abaixo dos 500€ e uns impressionantes 93,8% estão abaixo dos 1000€. Já na CGA, estas percentagens são, respectivamente, de 21,0% e 49,6%. Nas pensões mais elevadas a disparidade é também drástica. No regime geral, apenas 0,8% aufere uma reforma acima dos 2500€, enquanto a CGA paga estes valores a 11,6% dos seus pensionistas. Em resumo: enquanto no regime geral, apenas 21,7% dos trabalhadores recebe uma pensão ACIMA dos 500€, no Estado, apenas 21,0% recebe ABAIXO dos 500€.

Logo me dirão que no Estado as qualificações estão muito acima do que se verifica no privado. Isso é claramente verdade, mas também existe a queixa eterna de que os trabalhadores mais qualificados do Estado recebem muito menos do que no sector privado. Como é que isto é compatível com esta disparidade flagrante nas pensões?

Por uma razão muito simples: porque as condições de reforma no sector público foram sempre muitíssimo mais generosas do que no sector privado. Até há não muito tempo, no sector público a primeira reforma era igual ao último salário, o que, devido ao diferente tratamento fiscal, até se traduzia num aumento do rendimento líquido. Soube-se até do caso híper-escandaloso de um juiz que foi promovido para o Supremo Tribunal de Justiça, onde ficou apenas três meses, apenas para se poder reformar com uma pensão mais elevada.

De tudo o que ficou dito até aqui parece concluir-se que há duas alterações a introduzir nas pensões. Em primeiríssimo lugar, em todas as pensões que não resultem da totalidade da carreira contributiva, sejam elas no regime geral, ou na CGA. Em segundo lugar, dever-se-á criar um contributo que seja função do nível da pensão, mas tendo em atenção a carreira contributiva.

Quem tem uma pensão que resulta do último vencimento deve pagar a taxa máxima da nova contribuição de sustentabilidade. Nos casos em que a reforma decorre de toda a carreira contributiva idealmente deveria pagar zero desta taxa suplementar.

As reformas antecipadas, pedidas há muito, também deveriam ser alinhadas com as actuais condições. Quem não teve nenhuma penalização deverá ter agora a taxa máxima desta nova contribuição. Quem já teve a penalização actualmente em vigor não deve ter que contribuir mais.


Para as pensões acima dos 2500€, que abrangem apenas 3,1% dos pensionistas, dever-se-ia criar mesmo uma taxa extraordinária, temporária, enquanto a taxa de desemprego permanecer acima dos 15%. As receitas desta taxa extraordinária deveriam destinar-se exclusivamente a apoiar os desempregados de longa duração que neste momento deixaram de receber qualquer tipo de ajuda pública. 

[publicado no i, a 15 Maio 2013]

Sem comentários: