sexta-feira, 14 de outubro de 2011

E os "cortes racionais na despesa"?

Em entrevista ao Público a 7 de Setembro, o ministro das Finanças afirmou que “cortes racionais, estruturais e sustentáveis na despesa exigem tempo”. Infelizmente, do que se conhece do próximo orçamento, não há notícia de cortes estruturais nem sustentáveis na despesa.


O ministro não terá tido tempo, mas o PSD teve seis anos de oposição para se preparar para fazer esses cortes. Ou pelo menos, três anos desde que Manuela Ferreira Leite ganhou as eleições no partido e teve um discurso em que previa, em traços gerais, as necessidades presentes. A mudança de líder há ano e meio menos ainda pode servir como desculpa, porque menos de dois meses depois das eleições internas já Passos Coelho era “forçado” a dar a mão a Sócrates num duro pacote de austeridade.


O discurso da nova liderança foi veemente na recusa do novos impostos, presumindo-se que tivessem estudada a alternativa para quando fossem governo, o que se previa que pudesse acontecer dentro de não muito tempo.


Infelizmente, nada disso foi feito e andámos a perder um tempo precioso. Perdemos tempo face aos investidores a quem queremos convencer a comprar cada vez mais da nossa dívida pública. Perdemos tempo e, temo, capital político perante o eleitorado e a população em geral. Agora era o tempo de apresentar os tais “cortes racionais, estruturais e sustentáveis na despesa”. Daqui a alguns meses dificilmente o governo terá coragem e condições para os cortes que interessam a longo prazo.


O partidos de governo, e o PSD em particular, precisam de aprender que estar na oposição não pode ser andar a criticar as medidas que tomariam se fossem governo e dispersarem-se em temas secundaríssimos, mas sim prepararem-se para ser governo e para concretizarem as promessas que fazem.


O PSD nem sequer pode apresentar como desculpa as surpresas orçamentais, por duas razões. Em primeiro lugar, porque, quando estava na oposição sempre disse que havia buracos orçamentais e exigiu uma auditoria às contas públicas, exigência que depois, inexplicavelmente, deixou cair. Em segundo lugar, porque não estamos em presença de insuficiência de cortes estruturais, em que a insuficiência é explicada pelos desvios encontrados: temos uma quase ausência de cortes estruturais e sustentáveis.


Depois destas palavras severas para com o PSD, não posso deixar de criticar a irresponsabilidade da governação PS dos últimos quinze anos. Os socialistas não só espatifaram as contas públicas – a verdadeira razão da actual austeridade brutal –, como ignoraram todos os desafios estruturais com que Portugal se defrontou: a globalização, a mudança de regime económico com o euro, a resposta do Estado social ao inverno demográfico (aqui fizeram umas flores, mas muito insuficientes).

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